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Sim. Não.

  • Foto do escritor: Carlos Camacho
    Carlos Camacho
  • 2 de jan. de 2021
  • 3 min de leitura

Atualizado: há 2 dias


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O curso de Laurie Santos em Yale, a ciência da felicidade, logo se tornou um dos mais frequentados pelos alunos da Universidade. A geração ansiosa. Um de seus tópicos: gratidão. Virou palavra da moda. Essencialmente, nos lembra de agradecer habitualmente as nossas conquistas; o que já temos, vivenciamos, e não valorizamos. Terminei de ver um vídeo no Youtube que abordava exatamente este tema, mas com um destaque interessante: a gratidão há de ser expressa não pelas coisas óbvias, tipo, filhas sou grato por tê-las ao meu lado, mãe sou grato por tudo o que você fez por mim, mas sim pelo que geralmente nos passa despercebido.


Este é o momento em que você leitor deve destilar o seu humor ácido, aos 45 anos e você ainda não aprendeu a ser feliz? Sim. Não. É um tema filosófico que me falta competência para lhes transmitir maiores divagações. Cada um tem uma percepção do que seja felicidade e tristeza.


O que eu já aprendi?


A felicidade só existe porque há tristeza. A tristeza é o caminho para a felicidade. A felicidade é o caminho para a tristeza. São valores relativos que vão se complementando e se alternando ao longo de nossas vidas. A vida é um molho agridoce; pronto!


Eu deixarei os conceitos propositadamente abertos e vou logo para a crônica. Venho para a varanda e me boto logo a pensar sobre aquilo que estou deixando de agradecer para além do óbvio. Meu pé de manjericão: eu sei que você pode me ouvir e sou grato por você temperar meus ovos e meus molhos. Não fique chateado quando eu te mutilo. Sou grato a você por dar sabor à minha vida. Você é muito compreensivo! Quanto mais eu corto as suas flores, evitando que você cresça, mais folhas robustas e verdinhas você me devolve. Bato em uma face e você me oferece a outra.


Meu canivete suíço: você é o cara! É muito mais do que um multiuso. Quando te escolhi dentre tantos em sua cidade natal, Zurique, tive a sensação de realizar um grande sonho. Toda vez que eu te olho eu agradeço a amizade de um grande amigo, o Libanori, e me dou conta dos milagres da persistência. Só nós sabemos – como te confessei outro dia – o quanto olhei os seus irmãos em vitrines tupiniquins, mas nunca tive coragem de trazê-los. Sou grato por todas as vezes que você me ajudou a resolver pequenos incidentes diários.


Minha caixinha Bose: você sabe que te chamo carinhosamente de minha filhinha adotiva. E que minha filha não meu ouça! Já reparou quanto tempo passamos juntos? Praticamente eu durmo e acordo com você. Se eu estou na cozinha, você está lá toda engordurada. Na sala com os amigos ouvindo impropérios. Nos momentos de euforia e nos momentos românticos. Até enquanto tomo banho! Obrigado, por ser minha companheira de todos os momentos.


Leitor, mais uma oportunidade para destilar seu humor ácido: você só agradece coisas materiais antecedidas do pronome possessivo? A sua gratidão se resume a bens materiais?


Sim. Não.


Vamos então aos não materiais.


Morro azul: sei que você é verde e imponente. Toda vez que te olho me recordo de que sou passageiro. Uma folha. Você aí parado me acalma só pela sua existência. Você em cujas terras escravos pisaram. Em cujos arredores Dom Pedro I andou e comeu as coxinhas tão saborosas. Não, não imagino o horizonte sem você. Não! Nem posso imaginar uma planície em seu lugar. A vida é planalto. A vida é montanha. Obrigado por me ouvir e me inspirar seu fofo!


Meu gosto pela culinária amadora: aqui o agradecimento é mais psicológico, meio freudiano, porque não sou o eu consciente que me fez ter prazer em cozinhar. É algo inconsciente. Exceto quando corto o dedo ou queimo as mãos, eu sou grato pelos prazeres que essa paixão me proporciona.


Há quem reze com terços e berimbaus.


Eu rezo com alho, cebola, salsinha e coentro.


A cozinha é o meu oráculo.


Ela me traz lembranças da minha infância, das receitas de vovó, da minha adolescência, dos momentos mágicos que passo com as minhas filhas. Não consigo me imaginar sem você. Como seria a minha vida se eu não soubesse me divertir cozinhando? Triste.


As crônicas escritas: ah, por essa vocês crônicas não contavam, não é? Como é que você pode ser grato a textos escritos? Não sei. Posso lhes dizer que aprendi muito com vocês. E ainda aprendo. Obrigado por me proporcionar experiências incríveis e momentos maravilhosos; únicos. Sou grato pela oportunidade que vocês me dão de agradecer a gratidão gratamente grato.


Se são boas? Sim. Não.


Se são lidas? Sim. Não.


Se um dia serão esquecidas? Sim. Não.


Se são as melhores? Sim. Não.


São. Somos.

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