"Ao tormento da existência vem ainda juntar-se a rapidez do tempo, que nos inquieta, que nos não deixa respirar, e se conserva atrás de cada um de nós como um vigia dos forçados de chicote em punho. — Poupa apenas aqueles que entregou ao aborrecimento." Arthur Schopenhauer.
A arte é o intervalo entre o sofrimento e o tédio; produzida quando ausente o desejo de viver.
Lógico que a ideia da frase filosófica acima não é minha; é do filósofo pessimista. Não tenho essa envergadura, tampouco a crônica deve ir além da percepção de que uma certa felicidade é, por natureza, efêmera. Eu já tinha dito isso para minha filha, não baseada em Schopenhauer cujo primeiro contato se deu nessa semana ao ouvir Dores do Mundo, mas quando percebi que a vida vive resistindo apesar de você.
Hoje eu resumo esse sentimento como vida de adulto.
Basta ver o descompasso entre os dias úteis e inúteis.
Basta tomar café ruim.
Filha, lhe disse, só sabemos identificar os momentos felizes porque há outros infelizes, incertezas, frustrações e perdas; o que não temos, a nota baixa e a morte inesperada. Crescer é identificar a pena na vida que será cumprida por cada um; a seu modo. Quanto antes entendermos que nada na guerra da vida será fácil, menores as chances de desesperar-se diante dela.
La Cena, de Ettore Scola, é arte! (?) É, paradoxalmente, um intervalo. Vi mais esse da série do Festival de Cinema Italiano. Filmado em 1998 num restaurante cinematográfico italiano, chamado Arturo Al Portico, retrata os dramas dos clientes durante o jantar. Todos os diálogos são filmados, exceto o da mesa das senhoras. Estou eu ainda a pensar o porquê.
Tem de tudo: a mulher casada que deseja uma conversa com seus quatro amantes, a mãe que deseja evitar que sua filha vá para o convento, o filósofo que deseja uma amante subserviente, os japoneses que desejam colocar ketchup no carbonara, a noiva que deseja ter certeza se o seu noivo é o ideal para casar e os empresários que desejam não pagar tantos impostos. O desejo do chef de que seus auxiliares sejam mais cultos e não se interessem somente pelos finalistas do festival de San Remo.
Nesse ambiente, são raros, em cada mesa, os momentos de paz, risadas e de confraternização. Dito assim parece que o filme é carregado; não! Tem humor italiano. Bom, naturalmente que às vezes uma mesa incomoda a outra. Lógico que falam alto com le mani. Lógico que há aquele, o professor, que transita entre as mesas e novos vínculos se formam à medida que outros se dissolvem.
O desejo e a vontade postos sobre a mesa da vida; a movimentá-la do couvert à sobremesa.
O jantar termina com todos mudos e compenetrados ouvindo um dueto feminino de arpa e flauta para comemorar o aniversário da jovem sobrinha da dona do restaurante. E, após o bolo, a noite vai terminando para virar passado.
Encerra-se a noite tragicômica; o restaurante se fecha, o filme termina e a crônica acaba.
Tudo efêmero.
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