Estava no caixa de uma papelaria e uma moça me perguntou se eu era advogado.
- Sim, sou.
- Posso te fazer uma pergunta?
- Sim.
- Sabe o que é? Meu neto não vê o pai há muito tempo e vive agora com seu padrasto e minha filha. Ele queria tirar o nome do pai biológico e colocar o nome de seu padrasto.
- Que idade ele tem?
- Tem 17 anos.
Expliquei rapidamente o que eu pensava, falei do prazo, perguntei se havia algo mais além do abandono afetivo e material, desaconselhei o conflito e falei para ela consultar um advogado da confiança dela. A gente se acostuma a responder perguntas em situações sociais. Eu já tive várias fases. Já respondi exaustivamente, já falei que não era advogado por absoluta impossibilidade de tratar de qualquer assunto jurídico na ocasião em que me perguntaram e, hoje, eu respondo rapidamente o essencial e peço para procurar um advogado da confiança dela. Isso foi de manhã. No mesmo dia à tarde estava saindo de uma consulta médica cujo consultório fica próximo a um Hospital e, do outro lado da rua um carro parado com um homem sentado no banco do acompanhante me chama.
- Eu?
- É, vem aqui.
- Ir até aí pra que Senhor?
- Vem cá! Quero falar com o Sr.!
- Eu sei, mas eu te ouço, diga!
- Vem cá!
Mas que coisa, tô parecendo Jesus hoje! Não é possível, pensei.
- Sr., pode falar eu não vou até aí. Primeiro o Sr. fala o motivo e aí eu decido se atravesso a rua ou não.
- Eu machuquei a perna e preciso de um cachorro quente, o Sr. não pode me ajudar ?!
Olhei para o carro, pra ele...fiquei sem entender muito bem a situação. Toda vez que alguém me pede comida lembro que meu pai sempre me dizia que não se nega um prato de comida, pode até não dar dinheiro, mas o prato de comida é a esperança para o dia seguinte. Ao mesmo tempo me bateu um incômodo, confesso, o cara sentado lá no carro, grita pra mim do outro lado da rua e pede um cachorro-quente. No mesmo dia, à noite, estava no supermercado na fila dos frios:
- Com licença Sr., posso te fazer uma pergunta?
- Nossa, esqueci minha carteira no carro, preciso ir!
Tô brincando, eu só pensei essa resposta. Meu humor não andava lá dos melhores com exames médicos praticamente todos os dias, jejum, não pode fazer sexo, não pode tomar uma dose de Campari, não pode comer fritura, não pode andar de moto, não pode andar de bicicleta; e toma isso e toma aquilo. O que nos enche o saco não é o exame: é a desgraça do preparo. Com 34 itens pedidos pelo meu médico, mais dois exames suplementares, os preparos se multiplicaram. Hoje durante a ressonância da minha mão eu cochilei no meio do exame, feito numa máquina que é verdadeiramente um túnel do tempo. Acordei com um grito da moça que operava a máquina:
- O Sr. tá dormindo?! Não pode se mexer!
Ela disse através do sistema de comunicação, um alto falante que grita bem na sua orelha!
Que susto! Ela me acordou bem quando conversava com João Batista.
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