Não foi à toa que os italianos vieram para o Brasil.
Deixavam uma Itália precária; extremamente pobre.
Sem comida e sem trabalho.
Num navio a vapor e com pouca bagagem mais de 1,5 milhão por aqui aportaram entre 1896/1914. Meu bisavô chegou em 1906, no meio do boom. Há por aqui uns trinta milhões de descendentes de italianos. Vieram principalmente para Sul e Sudeste. E, depois de um perrengue lascado, nos brindaram com pizza, vinhos e massas. Não foi fácil. Muitos chegavam até suas terras pelo rio. Chegavam em terras brasileiras acompanhadas de um representante brasileiro cantando "America, America, America", construíam barracas improvisadas e começavam a plantar.
E aos poucos a miséria foi se afastando das gerações seguintes de italianos. Lembro dos finais de semana na casa de meu tio avô, Noro, em que suas irmãos faziam o cappelletti, dos jantares com pimentão recheado na casa da minha avó e a grande alegria em torno da mesa. Nos primeiros dias que estive na Itália eu me senti em casa. Enfim, não tinha que me conter vez ou outra pelo tom da voz ou pela gesticulação excessiva.
Lembrei-me disso tudo enquanto viajava a Botucatu esta semana. Resolvi fazer um caminho diferente e passar por estradas e cidades diferentes. Passei por Jumirim, Laranjal Paulista e Conchas. E logo me intriguei com nomes das cidades; como ganham os seus nomes. Mas foi mesmo o pequeno Vilarejo chamado Maristela que me perturbou. A estrada passa pela vila, bem no meio dela, um comércio rarefeito e casas à venda. Na verdade, Maristela é um distrito de Laranjal onde vivem cerca de duas mil pessoas.
Por que será que o Vilarejo se chama Maristela?
Quem teria sido Maristela, uma santa ou uma profana? Uma escrava que se rebelou e morreu no tronco? Ou uma viajante que teria ali montado um entreposto? Não, eu não vou gugar. Passa por ali a linha férrea. Eu tenho alguma coisa com trem. Não posso ver um trem trilhando que eu paro para ver. Não interessa se é Maria Fumaça, de época, ou se da Rumo transportando grãos e progresso.
Meu pai também adorava trens.
Era um de nossos brinquedos preferidos quando criança.
Eu e meu irmão passávamos horas montando os trilhos e vendo o trem rodar sem parar. Até que novas formações de estrada faziam o locomotiva descarrilar. Lembrei da Itália quando passei por Maristela. Lembrando de como as cidades forjam seu nome. Cresci tomando bronca para não brincar perto de uma mesa preta em que havia um mármore preto sem fixação. Cuidado! É mármore de Carrara! Mas só muito tempo depois, quando passava por uma estrada na Itália e vi vários mármores empilhados depois de retirados das encostas, que me caiu a ficha.
Não demorou muito a ver a placa Carrara! E dei risada.
Eu vou parar em Maristela na próxima viagem. Não deixarei o Vilarejo até entender a razão pela qual a cidade ganhou o nome de Maristela. Tomarei uma tubaína vendo o trem passar pela minha vida.
Vida, esse trem doido que a gente pega carona entre duas estações que todos passamos; a vida e a morte.
Comentários