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nossos dias D

  • Foto do escritor: Carlos Camacho
    Carlos Camacho
  • 8 de jun. de 2019
  • 3 min de leitura

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Todo temos um dia D.


Espaço.


O dia de uma grande decisão.


Fazer uma viagem maluca. Ter um filho. Abrir uma empresa. Plantar batatas. Conhecer o Líbano. Jogar tudo para o alto. Chutar tudo para cima. Fazer um curso de charcutaria ou mandar seu opressor para a puta que o pariu. Um dia decisivo. Um dia que a gente se liberta das opressões, dos medos ou dos receios e simplesmente faz. Simplesmente executa.


Na semana em que a história comemorou 75 anos do Dia D, o desembarque das tropas aliadas na Normandia, eu me lembrei do meu dia D.


De um deles.


Vinha já escrevendo contos esparsos sobre temas variados. Até que no meu dia D escrevi Overlord, o primeiro conto da série que se passa num pequeno Vilarejo no Sul do Brasil. E me deu tanto barato; e deu tanto barato na galera que eu mandei; que eu escrevi o seguinte na mesma linha. Ali decidi que Overlord seria o Conto D. E, na esteira das comemorações da história, eu transcrevo logo em seguida o trecho inicial de Overlord. Já já. Toda vez que eu parava para escrever os contos sobre a Segunda Guerra eu lembrava de uma velha reflexão que eu tenho toda vez que eu vejo as mazelas dos humanos, das guerras às desgraças cotidianas: o homem tem muito a evoluir. Mas nunca soube sintetizar numa só frase. Esta semana descobri o livro do Primo Levi contando sua passagem por Auschwitz chamado


"É isto o homem?".


Sim. Somos nós, os homens. Fique agora com o trecho inicial de Overlord, aliás é o nome da operação militar do Dia D. Vai:


"Evaristo dirigia pelas estradas desertas e parcialmente bloqueadas pela greve dos caminhoneiros. Sem conseguir abastecer seu carro, viu-se parado na estrada de terra às dezessete horas e quarenta e dois minutos. Mesmo sabendo que poderia ficar sem combustível decidiu arriscar. Faltavam dezessete quilômetros e cem metros de estrada de terra até chegar ao asfalto, talvez ali com a ajuda de alguma carona conseguisse resolver o problema. Encostou o carro na grama e desligou o som. Tomou água, desceu do carro e, olhando ao redor, nada viu além de plantação de eucalipto. Logo se deu conta de que não conseguiria chegar em tempo às reuniões daquela tarde e, provavelmente, o almoço que tinha com o seu filho no dia seguinte. Andou de um lado para outro, ponderou se seguiria até a estrada mas logo desistiu. Seu celular estava sem sinal. Pretendendo diversificar, decidiu pela primeira vez investir em agropecuária. Percebeu que seria muito mais difícil do que imaginou mas arrepender-se e voltar atrás estaria fora de cogitação. Sentiu o cansaço da semana e cada vez mais pensava em sua aposentadoria. O ritmo frenético de sempre já não lhe trazia tantos prazeres. Não ignorava que precisaria investir mais tempo em sua esposa e filhos. Estava rico e vinha encontrando dificuldades em reduzir o ritmo. Suspirou profundamente sem perceber. Estremeceu. Tonteou um pouco e se viu obrigado a deitar na grama. Com a brisa de madeira queimada entre eucaliptos o cansaço tomou conta de seu corpo inteiro. Colocou o revólver debaixo de seu Panamá e fechou os olhos esperando despertar dali a meia hora. Suspirou novamente, nada além de mato e brisa. Ouvindo calmamente o silêncio deitou-se na grama que confortava as suas costas e cabeça."

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